terça-feira, 27 de setembro de 2011

O EXEMPLO

Por Frank Domingues

...esse é o lado certo da vida erra! Assim começa uma frase usada nos morros e favelas brasileiras para justificar a justiça imposta aos devedores e meliantes aos quais ficam em divida com a “comunidade”.
Quando cito do Brasil, e com todo contexto da frase,não pense que apenas restrito a grandes capitais. Isso também esta ocorrendo em pequenas cidades do interior e zonas rurais. Além de terem de lidar com as amarguras de terem filhos usuários e dependentes químicos, as famílias tem que suportar os castigos impostos pelo tráfico. Castigos físicos que servem de exemplo para não cometerem mais delitos e para evitarem que surjam novos infratores.
Esses infratores nunca escapam do júri da periferia. Sentenças, bastantes severas, que muitas vezes deixam marcas eternas ou levam os julgados à morte. Certa manhã de domingo, presenciei uma cena no HPS da minha cidade. Houve certa movimentação próxima à emergência. Vi quando solicitaram a reserva da sala para a realização de um exame de emergência. Após alguns instantes entra Leandro (nome fictício do adolescente de 14 anos filho de um amigo). Com as mãos enfaixadas, marcas de choro e dor no rosto. As ataduras manchadas de vermelho denunciava alguma ferida de difícil estancamento.
Logo me pus a buscar saber o que houve e tentar ligar para meu amigo. Leandro me reconheceu e em lágrimas começou a chorar e pedir para ligar para sua mãe. Após alguns instantes, fui retirado da sala de emergências e apenas ouvia uivos de dor do menino. Algumas horas após, o médico veio até mim para saber se eu o conhecia e também aos seus pais. Respondi que sim, e que já havia ligado para ambos, mas não obtive sucesso. Falei também que poderia assinar a documentação de entrada do menino.
No desenrolar da conversa, o médico me disse que ele teve todos os ossos das mãos violentamente quebrados, pois o mesmo teve as duas mãos postas em cima de um paralelepípedo e recebeu cinco marretadas em cada uma delas. Seria difícil a reconstrução e recuperação óssea, e que provavelmente, terias ambas as mãos amputadas. Seguidamente chegara seus pais, relatei as palavras do médico a eles e minha suspeita confirmou-se nas palavras de um pai em sofrimento: ele devia R$ 200,00 ao tráfico.
A tristeza da família eterna representa um futuro destruído pelas drogas e uma vida limitada por dever R$ 200,00. Seria melhor que tivesse sido executado do que viver nessa tristeza profunda e ilimitada para qual a família viverá?
Ao menos que esse tipo de situação sirva, para que, muitos que estão pensando em vacilar e entrar para essa vida de castelo de ilusões, opte por seguir o caminho mais difícil que esse sim trará a verdadeira felicidade. Aos pais que também conhecem o Leandro tomem atitude de conversar abertamente com seus filhos para manter longe desse mundo miserável e sem volta, a final, o verdadeiro malandro e esperto é aquele que aprende com os erros dos outros.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Racismo doce

Por Manoel Soares
Publicado em O Diário Gaúcho, 09 de setembro de 2011.

Sempre que falo sobre racismo ou outras formas de preconceito as pessoas pensam que é porque sou negro, parte desse pensamento é verdade, o fato de ser negro me faz saber experiencialmente o peso de ser sub-julgado por conta de uma característica física.

Porém, minha luta não é em causa própria, não é em favor dos negros, mas em favor do que acho certo. Existem leis que são falhas, que não correspondem ao que é justo, neste e em outros assuntos. As leis um dia permitiram que pessoas fossem espancadas, vendidas e escravizadas, hoje essas leis são repugnadas por nós, assim como nossa lei de hoje um dia será motivo de vergonha para as gerações futuras. Mas se as leis não são nosso norte, o que devemos seguir então?

Acredito que o bom senso, a capacidade natural de se colocar no lugar do outro, essa deve ser nossa meta sempre, se assim fizermos a chance de nos rendermos aos pré-conceitos é mínima. Estão chegando a mim muitas histórias de crianças negras que são tratadas de maneira hostil pelos colegas na escola, as professoras se defendem dizendo que fazem de tudo para que isso não aconteça, por outro lado não podem fazer nada se os pequenos reproduzem as lições aprendidas em casa.

Estes dias li em um twitter que o berço é o adubo do preconceito, sou obrigado a concordar, as palavras ditas no ultimo domingo pelo ator Robrigo Lombardi no Domingão dos Faustão na final da Dança dos Famosos indica isso. Ele disse que apesar de ser negro, baixinho e caolho o cantor e dançarino Sammy Davis Junior no palco parecia um loiro, alto de olhos azuis. Quem disse que o bonito é assim?

Na ignorante inocência de suas palavras o ator global vomitou o mais doce preconceito que mora em milhares de corações que reproduzem o conceito de sucesso imposto por uma educação social baseada em um ideal quase nazista.

Cabelo ruim, nuvem negra, passado negro entre outros termos fazem parte desse cotidiano racista que nos invade diariamente. Convém lembrar aos que ficam pessimistas que a vida já foi bem pior, convém lembrar aos otimistas que poderia ser bem melhor e aos realistas que cabe a nós mudar o que acreditamos estar errado.