Por Rodrigo Ramos
É indiscutível a existência de uma clientela preferencial por parte das agências de punitividade ao redor do Mundo e no Brasil não é diferente. Normalmente, os criminalizados são pobres, moradores de áreas consideradas de risco e em sua maioria afro-descendentes. Essa seletividade do sistema penal se deve a discricionariedade dos agentes estatais designados para manter a ‘ordem’ e a ‘paz’.
Vivemos em um país que se orgulha de seu espectro multifacetado e que gosta de propagandear que aqui não há racismo ou discriminação de qualquer gênero. Números mostram que a maioria dos consumidores de drogas ilícitas são pessoas brancas de classe média-alta. Por outro lado, em grande parte das vezes, os imputados por crimes de uso e posse de entorpecentes são jovens, negros e pobres.
As questões envolvendo preconceito e seletividade do sistema penal são muito bem abordadas nos livros Cabeça de Porco de Celso Athayde, MV Bill e Luiz Eduardo Soares e Da Revolta ao Crime S/A de Alba Zaluar. São duas obras obrigatórias para quem quer entender melhor esse país que nos prega tantas peças, ambas as obras com força sociológica e antropológica.
Uma dos questionamentos apontados, especialmente por parte de Zaluar, é a famosa ‘atitude suspeita’ que legítima boa parte das ações policiais. Para alguns a ‘atitude suspeita’, pode ser a simples maneira de uma pessoa caminhar. Isso já acarretará julgamentos morais e podem redundar em uma abordagem policial. Vou citar um exemplo pessoal que caracteriza bem como funciona o pensamento estigmatizado e estigmatizador dos policiais aqui no Brasil.
Atuei como jornalista esportivo por mais de cinco anos e quando andava pelos estádios com o crachá escrito IMPRENSA, tinha a sensação de poder fazer o que bem entendesse, não havia qualquer aproximação policial. Mesmo que eu andasse com portentosas mochilas que poderiam carregar inúmeras coisas, proibidas ou não. Em minha época de atuação só fui abordado por policiais na Argentina, no nosso país vizinho fizeram uma rigorosa inspeção em minha mochila. Em minha época de torcedor também havia diferenças, quando entrava nas sociais dos estádios aqui em Porto Alegre recebia pouca ou nenhuma revista. Ainda mais quando estava sem camiseta de time ou usando calças. Já quando queria assistir os jogos na parte destinada as torcidas organizadas ou auto-entituladas não organizada ou estava de bermuda e chinelo recebia uma abordagem digna de caracterizar a revista como ato sexual.
Os exemplos da seletividade são inúmeros e a maneira de pensar da sociedade, a qual se reflete na atuação dos agentes do governo só comprova que quase sempre os mesmos são perseguidos e, portanto, vemos um certo tipo de pessoa acabando por ser enquadrada como ‘marginal’, usando uma das expressões favoritas dos punitivistas. Um simples emprego ou a forma de se vestir é capaz de iludir o sistema, se eu pudesse dar uma dica para fugir de ‘problemas’ com a polícia eu diria: use um terno e mantenha um olhar que sugira superioridade!
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