segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O outro lado das praias

Por Manoel Soares
Publicado em 28 de Fevereiro no Diário Gúcho

Nesta semana, eu assumi, no Jornal do Almoço, o quadro Caminhos de Verão. Estou percorrendo várias praias do Litoral Norte, muitas delas pouco conhecidas, mas muito lindas.
Paralelamente a essas experiências, comecei a notar que existe uma parcela da população nativa que vive em situação de extrema miséria. Pessoas que são obrigadas a viver o ano todo com o medo de não saber o que vai comer no outro dia. Se, para os veranistas, curtir uns dias na praia é alívio, para eles, é a possibilidade de ter um pouco mais de dignidade.
Conversando com alguns jovens que estavam sentados à beira-mar em Tramandaí, um deles me disse que, quando tinha oito anos, tomou uma surra de um grupo de veranistas. Ele invadiu uma casa para roubar comida. Claro que, por pior que seja a situação dos nativos, eles não têm o direito de invadir a casa de ninguém. Por outro lado, não ter uma solução para as periferias do litoral estimula cada vez mais esses delitos.
Não há como crescer economicamente sem proporcionar desenvolvimento humano aos mais pobres. Se a galera da favela vê uma parcela da sociedade crescendo e ela só se afundando, aos poucos, vai se convencendo que pode chutar o balde por não ter nada a perder. Nessa hora, começam os conflitos.
Ricos e pobres sempre vão existir, mas uma casa com duas piscinas perto de gente que cata lixo na beira da praia é combustível para a violência. Não concordo com favelado que usa a miséria para advogar em causa própria. Por pior que seja nossa situação, meter um ferro na cintura e partir pro arrebento nunca é solução, mas a solidariedade humana de quem tem mais e a responsabilidade social dos poderes públicos locais também deve falar alto, se não, a avalancha desce mesmo e a casa cai.
Óbvio que, no meio disso, existem os viciados em pedra, os que não têm intimidade com o trabalho e os filhinhos de papai que veem em “pagar de bandido” uma vida emocionante, mas estes aí em pouco tempo recebem o que merecem.
Valeu, galera!

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Que justiça é essa?

Por: Rodrigo Ramos
Colaborador/Colunista CUFA RS

A reclamação mais recorrente em relação ao sistema judiciário no Brasil é sobre a sua lentidão e claro que os processoes demoram por demais, mas com o número de feitos que correm na justiça difícil seria imaginar coisa diferente. Em 1995 foram criados os Juizados Especiais, Cível e Criminal, com o intuito de desafogar o sistema. No entanto, não foi isso que se viu com o passar dos anos. Ouvi uma vez que justiça rápida, não é justiça e concordo. Por mais que se queira agilizar o sistema judiciário, este não é nem deveria tentar ser uma cadeia de fast food a distribuir decisões.

Se fala muito no grande número de recursos proporcionados as partes durante um processo e eu me pergunto qual o problema disso? Estamos lidando com coisas sérias, as quais podem afetar em grande escala a vida de uma pessoa. Quem clama desesperadamente por rapidez, sem dúvida, gostaria de dispor de todo o tempo possível caso estivesse envolvido em um processo judicial. As decisões judiciais devem ser tomadas após uma longa análise dos julgadores a partir do que ocorre nos autos, devendo haver uma plena cognição de tudo que está contido no processo. Com isso, diminui em muito a chance de vermos erros por parte de juízes, desembargadores, etc. Imagine se isso não ocorresse.

No que concerne ao Direito Penal é ainda mais importante a calma na hora de julgar. Afinal, uma condenação pode redundar em prisão e é de conhecimento amplo o sofrimento nos cárceres por todo o país. Logo vem o discurso de proteção ao bandido, se esquecem essas pessoas que o crime está por toda a parte, desde um download até um homicídio. Nunca faz mal se colocar na posição do outro, ninguém está livre de cometer um delito e ver a mão que antes apontava dedos em riste algemada, ao passo que os que estavam "do seu lado" lhe viram as costas.

Sobre os Juizados Especiais fica latente que se trata de uma "sub-justiça" dedicada principalmente aos que menos podem, como se esses não merecessem receber toda a guarida do Estado. Na parte criminal, há uma forte ofensa para com as garantias básicas do acusado, propiciando diversas arbitrariedades. Pelo lado cível o que se percebe é que quase tudo virou motivo para começar um processo com a falsa ideia de que o Juizado resolverá tudo rapidamente e de forma pouco onerosa. É bom lembrar que a justiça não deveria se ocupar de bagatelas e o que deveria ocorrer é a propagação de soluções de conflito não contenciosas, através de acordos e conciliações, por exemplo. Acho que a criação dos Juizados não trouxe benefícios para o sisteme e nem para a população.

Por mais que sigamos com esse problema da demora de resposta do judiciário creio que devemos entender que o sistema é assim e que não melhora com soluções mágicas, estas podem acarretar em graves problemas. Problemas estes que por vezes não tem reparação. Você pode se ver envolvido em um processo e afirmo sem medo de errar que é melhor a dita morosidade do que um processo rápido e equivocado

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

CULTURA, IMPORTANTE FERRAMENTA DE TRANSFORMAÇÃO

História e paradigmas

Por Anderson Zanovello
Anderson Zanovello, produtor cultural e coordenador da CUFA Colíder
Cultura não é somente uma dança, música, cinema, ou desenhos, é algo muito além, por exemplo: em determinadas partes do mundo um homem (desde que tenha dinheiro) pode ter várias mulheres, em nosso país já é monogâmico, porém o ser humano já carrega em sua genética a poligamia, exemplo disto é super raro uma relação conjugal sem traições, apesar de eu acreditar que existam muitos casos, porém o casamento é somente permitido entre duas pessoas, mas acredito também que seria muito complicada a convivência em uma relação matrimonial com mais de duas pessoas, eu não viveria assim, mas já fui criado dentro desta cultura o que torna natural eu pensar dessa maneira, é a cultura de cada pais, de cada pessoa.

No Brasil choramos e ficamos tristes no dia de finados, já no México eles fazem festa e grandes banquetes, pois acreditam que Deus permite que os mortos venham visitar suas famílias, que ainda estão na terra, e que podem comer de sua comida favorita, por isso, os grandes banquetes. Vamos criticá-los por isto?Jamais, é a tradição deles.

Eu pratico skate, na área de esportes radicais, e essa modalidade é um importante integrante de várias culturas, destacando-se a já reconhecida por lei A CULTURA HIP HOP, ou seja, cultura urbana. Sofremos muitos preconceitos, sempre somos marginalizados, mas infelizmente não é somente skatista, várias manifestações culturais passam por isso.

 O HIP HOP é um dos casos, infelizmente, porém somos uma das expressões culturais mais  abrangentes em todo o país, senão do mundo, mas esbarramos,na realização de eventos, no pouco conhecimento tanto teórico quanto prático. Dessa forma, os mais instrumentalizados ficam com fatia maior do bolo,quando o assunto é capitação de recurso e patrocínio, ou seja, o povo rico, pois seus eventos culturais, em sua maioria, sempre têm um maior impacto, tudo recebe patrocínio, e nós sempre somos obrigados a tirar grana do nosso bolso. Será que somos tão ruins assim? O que nos falta?

Agora falando de periferia, em alguns lugares, e da favela, em outros, nós sempre direcionamos nossos projetos para essas localidades, apesar de ainda não estarmos com força total, mas em breve vamos mobilizar geral em todas as regiões de Colíder, temos esse foco; elevar a autoestima do público que atendemos, pois somos mal atendidos quando vamos comprar em uma loja, ou ainda não merecemos participar das mesmas festas que os ricos, trabalhei em uma festa outro dia e um burguês disse que não gostou da festa porque tinha muito “zé povinho” (nos da periferia).

Eles falam que tem medo de vir em nossos bairros que é muito perigoso, somos tachados de drogados, entre outros sinônimos, porém nossos projetos são, inclusive, para bater de frente contra tudo, pois não posso negar; na favela tem tráfico, tem drogas, tem violência, porém lá no centro isso já é realidade, mas nos bairros periféricos, tem muita coisa linda também.

 Mas diante de tudo isso a cultura e suas diversas manifestações, chamam atenção para o Skate, é extremamente necessária na vida do ser humano, pois ela é muito ampla e por meio dela podemos sonhar e realizar esses sonhos podemos ser felizes e levar felicidade a outras pessoas, podemos conhecer o mundo, ou de repente, conhecer melhor o que esta bem perto de nós mesmos.

O gosto do queijo

Por Manoel Soares
http://wp.clicrbs.com.br/paporeto
Coluna Semanal 14 de janeiro de 2011 Jornal Diário Gaúcho

A maioria dos que conheço tem uma necessidade constante de ser visível, combater o anonimato, que insiste em nos perseguir, e nós, por nossa vez, fugir da invisibilidade.

Muitos, nessa tentativa, perdem o controle e batem nos muros da vida. O problema é que definir o sucesso nos dias de hoje passa por ser reconhecido para os outros, é como se nosso lugar no mundo dependesse de como as pessoas nos veem.

Há muito tempo, li em um livro que, na África, quando uma criança nascia, seu pai levava o bebê até o ponto mais alto que conhecia e cochichava no ouvido do filho o nome dele, pois deveria ser a primeira pessoa a ouvir o próprio nome. Depois disso, ele erguia o nenê para o céu e gritava:

- Esta é a única coisa maior do que você neste mundo!

Desse momento em diante, o pequeno africano ganhava uma identidade que lhe acompanhava pelo resto da vida, tivesse ele duas cabras ou 5 mil camelos.

O problema é que, na nossa cultura, é diferente. O que temos nos define como indivíduos e, enquanto não temos, não somos. Isso nos consome a ponto de corroermos o que nos cerca.
Não é somente uma questão de consumo, mas de forma de ver a vida, pois quem acha que se tornou melhor por ter um tênis, um celular ou um carro jamais será melhor do que é. Tentar compensar as limitações pessoais com bens materiais é como comer sabão por acreditar que tem gosto de queijo. De tanto fazer isso, a pessoa esquece que gosto realmente tem o queijo.
É óbvio que ter conforto contribui para a felicidade, ninguém pode ser feliz se ver que está na rabeira da cadeia alimentar. Entretanto, nosso sucesso externo é somente o reflexo do nosso sucesso interno. Inverter essa lógica pode ser perigoso, é nos fazer de marionetes de consumo em um mundo que não existe.

O ideal é que a nossa visibilidade seja calçada no que somos e isto resulte em termos tudo que merecemos. Afinal, quem gosta de pobreza é intelectual.

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

A essência da Favela: é o que desejo para todos em 2011.

Artigo para o Editorial da CUFA Brasil

Há mais ou menos sete anos venho acompanhando e aprendendo mais sobre diferentes realidades sociais de comunidades ditas vulneráveis e que, na maioria das vezes, são excluídas dos processos políticos e de desenvolvimento econômico. Com isso, pude começar a construção de minhas opiniões e visão crítica dessas realidades, onde eu também estava incluída.

Mas, desde que conheci a CUFA, passo por um processo inverso de desconstrução de todas as minhas concepções e percebo que poucos, a começar por mim, realmente conhecem e entendem a realidade, por exemplo, de uma favela e seus moradores. A sociedade em geral se cobre de uma moral que culturalmente separa os “bons” dos “maus” - mesmo sem ter certeza do que é bom e mau - que afasta os problemas para fingir que eles não existem e rejeitam qualquer outro tipo de visão que não se enquadre nos seus moldes, sem se quer buscar se informar e debater.

Um exemplo prático disto, aconteceu esta semana, onde a coordenadora de uma das bases da CUFA no Rio Grande do Sul, recém eleita, foi questionada do por quê estava assumindo uma entidade que tem “visão de pobre”, que pratica esporte na rua ao invés de colocar em quadras bem estruturadas, que não busca melhorar e mudar as favelas para “bairros”.

Isto demonstra a total falta de informação e conhecimento não só sobre o trabalho da CUFA mas, principalmente sobre o contexto em que vivem as famílias em suas comunidades e suas aspirações. O esporte de rua, a moradia e a falta de infra estrutura não foram escolhas e sim as únicas opções. No entanto, percebo nas pessoas, o sentimento de viver bem em comunidade, de ajudar uns aos outros e participar da vida das pessoas sem preconceitos ou pré julgamentos. Ao contrário dos bairros onde predomina uma classe média alta, onde a visão capitalista determina que ali é cada um por si e Deus que se vire por todos.

Em apenas dois anos entrei, virtualmente, em diversas favelas de todos os Estados brasileiros, com suas diferentes características, com seus diferentes modos de (sobre)vida mas, com algo em comum, a tão sonhada união, solidariedade e alegria de viver entre as pessoas.

Mesmo com todos os entraves sociais, que a sociedade em geral insiste em ignorar, vemos todos os dias nas comunidades mutirões de moradores para construir a casa de um vizinho. Ou então, a mobilização para ajudar a levar um doente ao hospital - já que são poucas as ofertas de postos de saúde ou pela dificuldade de trafegabilidade dentro das favelas. Claro que isso não acontece em todas as comunidades mas, essas situações, não são exceções dignas de uma matéria no telejornal, como acontece nos bairros de classe alta, por exemplo.

Os esportes praticados nas ruas se fortaleceu pela convivência diária entre os moradores. Se reunindo para conversar, cantar, jogar, enfim, viver. Até por que, se fossem esperar para ter uma quadra ou campo adequados para a prática de esportes, não teríamos tantos reis e príncipes do futebol ou do basquete brilhando dentro e fora do país.

Temos que deixar de lado a falsa moral que não responde mais aos nossos questionamentos e que não apresenta soluções realistas e adequadas aos diferentes contextos sociais das comunidades brasileiras. Temos que parar de pensar que para sermos felizes temos que seguir à risca a essência do capitalismo que faz das pessoas individualistas e egoístas, com metas de acúmulo de riquezas às vezes às custas da pobreza dos outros.

As favelas querem deixar de ser favelas pelo conceito de espaços de violência, criminalidade, falta de capacidade intelectual e tantos outros estigmas históricos que lhe foram impostos mas, não querem perder a sua essência, a de viver bem em sociedade e crescer juntos onde todos multiplicam suas riquezas.

Náthaly Weber
Relações Públicas, Coordenadora de Comunicação da CUFA RS.